CIDADANIA INDÍGENA, DECOLONIALIDADE E ESTADO PLURIÉTNICO
Palavras-chave:
Cidadania indígena; decolonialidade; Estado pluriétnico; direitos indígenas.Resumo
O processo de colonização brasileiro resultou na negação e no desrespeito às identidades étnicas e culturais dos povos indígenas. O conceito tradicional de cidadania, fundamentado no ideário liberal e na igualdade, não era capaz de reconhecer as distinções identitárias e culturais dos indígenas. Desse modo, para a obtenção do status de cidadão, impôs-se aos povos originários a sua assimilação à sociedade geral. Assim, para que tivessem acesso ao reconhecimento jurídico, era necessário que fossem integrados à dita civilização, o que significou a anulação de seus direitos e tradições. Como resultado das lutas por reconhecimento dos direitos indígenas, fundamentadas na decolonialidade, a Constituição Federal de 1988 promoveu a reelaboração do conceito de cidadania indígena, tendo como objetivo a preservação da diversidade étnica e cultural dos povos indígenas de que modo o conceito de cidadania indígena vem sendo construído, bem como apresentar algumas estratégias políticas e jurídicas utilizadas para a sua constituição. Para tanto, utilizou-se de abordagem qualitativa e exploratória, com técnica de pesquisa de análise documental, a partir da seleção de textos normativos e científicos sobre o tema. Ao final, verificou-se que as tensões políticas e lutas por reconhecimento vêm contribuindo para a solidificação de um novo paradigma, que tem o potencial de proporcionar a consolidação de um Estado pluriétnico. Esse movimento amplia a capacidade de reconhecimento e valorização da diversidade cultural e o etnodesenvolvimento brasileiro, e pode contribuir para a efetivação de direitos indígenas, tais como a demarcação e proteção de suas terras.
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